Dia de São Vicente, protetor da vinha e do vinho
Domingo agora, 22 de janeiro, os franceses comemoram o dia de Saint-Vincent, padroeiro da vinha e do vinho. A data será lembrada com festas e orações por parte dos vinhateiros, que vão pedir por um bom ano e que o santo proteja os vinhedos das calamidades naturais. Seu nome verdadeiro é San Vicente de Zaragoza, nascido na Espanha e martirizado no século IV d.C. É venerado por fiéis de todo o mundo, mas curiosamente apenas na França é tido como patrono das pessoas que trabalham com vinho.
Ao contrário de outros países, que retratam o santo geralmente em vestes sacerdotais, a exclusiva iconografia francesa mostra Saint-Vincent com um cacho de uvas na mão.
Há muitas comemorações marcadas na Borgonha, promovidas por associações vinícolas. Há mais de 80 delas na região. Entre as mais conhecidas está a festa organizada há 79 anos pela famosa Confrérie des Chevaliers du Tastevin, chamada de Saint-Vincent Tournante, por sempre envolver duas cidades e o roteiro vai de uma a outra. Acontece no primeiro fim de semana após o 22 de janeiro. Este ano, os festejos vão ocorrer nas cidades de Mercurey e Saint-Martin-sous-Montaigu nos dias 28 e 29 próximos.
Os festejos na Borgonha costumam atrair mais de 100 mil pessoas a cada ano, com desfile de delegações das comunas vitícolas de toda a província e muitas outras atrações. Os integrantes da Confrérie des Chevaliers du Tastevin marcham pelas ruas com seus trajes coloridos antes da missa solene. Depois da cerimônia religiosa, chega a vez do vinho e da alegria profana. Come-se e bebe-se com fartura e as caves das vinícolas ficam abertas para degustações.
No próximo fim de semana, shows de grupos musicais e eventos gratuitos estão programados para Mercurey e Saint-Martin-sous-Montaigu e assim é perpetuado o espírito da celebração, que evoca antigos ritos agrários e o eterno ciclo da natureza.
Origem do culto
Há muitas teorias para explicar a escolha do santo como padroeiro da vinha e do vinho na França. Alguns escritores dizem que a lembrança se dá porque na liturgia católica o vinho é associado ao sangue de Cristo. E em francês, o nome Saint-Vincent soa como “vin sang” (vinho sangue) ou “vin saint” (vinho santo). Para outros, seria sinônimo de abundância, “vin cent” (vinho cem).
Mas pode haver outras razões para o prestígio de Saint-Vincent junto aos vinhateiros, reminiscência de velhos rituais com que o homem sempre cercou as práticas agrícolas. Para esses autores, os santos padroeiros seriam os sucessores da tradição ligada aos deuses do vinho, presente na cultura dos povos antigos.
Jean-François Gauthier, então chefe do serviço jurídico do Office National Interprofessionnel des Vins, entidade que regulamentava a atividade vitivinícola na França, observa em seu livro “Le Vin” (Editora Le Cavalier Bleu – França – 2001 – 127 páginas) que a data dedicada a Saint-Vincent, 22 de janeiro, no Hemisfério Norte cai nos últimos dias em que a geada pode ser fatal para as vinhas – daí a necessidade de uma ajuda dos céus.
É um período crucial do ciclo anual das plantas em geral, e da videira, que corresponde mais ou menos ao solstício de inverno e à passagem do estado de latência da vegetação até seu ressurgimento, na primavera. Interessante notar ainda que, antigamente, 22 de janeiro era o dia em que se iniciava a poda de inverno, a poda seca, na Europa. Hoje essa tarefa normalmente é antecipada para dezembro.
A ligação atávica dos agricultores com a divindade é compreensível. No mundo do vinho não é diferente. Uma geada tardia, uma tempestade de granizo, chuvas em excesso ou estiagem prolongada podem resultar em uvas de baixa qualidade ou mesmo por a perder o trabalho de um ano inteiro. Dependente da natureza e sujeito a toda espécie de percalços, o vinhateiro recorre a diferentes protetores, cada um com sua própria especialidade.
Gauthier relata em seu livro que mais de 30 santos patronos podem ser mencionados para os vinhedos franceses. São festejados ao longo do ano Santo Antonin, São Friard, São Gautier, Santa Genoveva, São João Porta Latina, Santa Madalena, Santo Urbano, São Werner e até um São Baco! Mas os principais sempre foram São Martinho (cultuado em 11 de novembro) e São Vicente de Zaragoza.
A vida do santo
Vicente nasceu em Huesca, na Espanha, e era diácono assistente do bispo de Zaragoza. Foi torturado e morto em Valência no ano de 304 d.C. durante a violenta perseguição aos cristãos imposta pelo imperador romano Dioclesiano (284 a 305 d.C.). Considerado um dos mártires da Igreja, sua fama de santidade conquistou a Espanha, França e se espalhou pela Europa.
No mesmo século da morte trágica, seu corpo foi transferido para uma basílica situada fora das muralhas que protegiam Valência – e, por isso, ele também é conhecido como São Vicente de Fora. Segundo a historiografia cristã, relíquias do santo estariam divididas por diversas igrejas europeias.
Ele é padroeiro oficial de muitas cidades. Entre elas, Lisboa, onde é venerado na igreja de São Vicente de Fora – também chamada de Mosteiro de São Vicente de Fora – localizada no bairro histórico da Alfama.
Desde a Idade Média
Na França, a devoção dos vinhateiros a Saint-Vincent é bastante remota. A crença é atestada nos muitos ditos populares envolvendo o nome do padroeiro. “Saint Vincent notre Patron, protège notre bourgeon et dans la saison donne nous du bon”, diz um deles (São Vicente, nosso patrono, proteja nossa brotação e, na estação, nos dê tudo de bom – em tradução livre).
“Soleil à la Saint-Vincent, le vigneron s’en va chantant” (Se faz sol no dia de São Vicente, o vigneron vai embora cantando). Ou o contrário: “Si ce jour il pleut, au vin le vigneron dit adieu” (Se neste dia chove, ao vinho o vinhateiro dá adeus). Outros padroeiros não tiram a primazia do santo, como cantam os versos: “Cavaleiro, discípulo, companheiro,/Baco tem sua devoção,/Mas para todo vinhateiro/São Vicente é o patrão”.
A tradição dos festejos começou no ano de 900, na Idade Média. Perdeu força ao longo do tempo, mas foi retomada com vigor em 1938 após campanha da Confrérie des Chevaliers du Tastevin, que tem sua sede no lendário Clos de Vougeot, no coração da Borgonha. Agora em 2017, em Mercurey e Saint-Martin-sous-Montaigu, a festa de Saint-Vincent Tournante chega à sua 73ª edição.
Aniversário
Em São Paulo, a data dedicada a São Vicente de Zaragoza marca o nono aniversário do restaurante que celebra o nome do santo, a Enoteca Saint VinSaint, do casal Lis Cereja e Ramatis Russo. A casa abriu as portas em 22 de janeiro de 2008 e se consolidou como um dos bons endereços gastronômicos da cidade. A comemoração começa com um jantar especial no dia 21, sábado.
Com apenas 15 mesas, a marca da enoteca é ter carta exclusiva de vinhos naturais, orgânicos e biodinâmicos; trabalhar apenas com insumos orgânicos na cozinha; e produzir boa parte do que é servido nas mesas. É uma coleção de princípios que o patrono, com certeza, aprovaria. http://www.saintvinsaint.com.br/
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