by José Maria Santana | 19/03/2017 15:29
Antonio Menéndez entrou em 2015 na Vega Sicilia como diretor geral. Responde também pela parte comercial e marketing de todo o grupo. Estudou com os padres jesuítas e depois se formou em Administração de empresas. Antes de entrar no mundo dos vinhos, trabalhou em empresas de grande apelo ao consumo, como Pepsi, L’Oreal e Paramont Filmes. Ao passar por São Paulo nesta semana, deu entrevista ao Brasil Vinhos. Falou sobre a bodega, sobre o ícone Vega Sicilia Unico e contou que um novo projeto vinícola, o sexto do grupo, já está em andamento.
Quando foi lançado o primeiro Vega Sicilia Unico? Uns dizem 1915, outros 1917.
O primeiro vinho que se criou em Vega Sicilia foi em 1864, quando a bodega surgiu. Naquele momento existia somente um vinho, e não três, como hoje. Mas de fato a primeira garrafa que provamos fisicamente foi de 1915. Fizemos uma degustação especial aqui mesmo no Brasil, há dois anos. Foram 125 safras de Vega Sicilia, entre eles 74 de Unico e 36 de Reserva Especial. Em ambos os casos chegamos à primeira colheita disponível, 1915 para o Unico, 1950 para o Reserva Especial.
Antes disso não há registros referentes ao Unico?
Há alguns meses nos chegou uma informação enviada por um colecionador chinês, de Hong Kong, dizendo que tinha uma garrafa de Vega Sicilia, acho que de 1907 ou 1908. Oferecemos comprar esta garrafa e quisemos mandar alguém técnico a Hong Kong para analisá-la. Depois disso, o colecionador simplesmente desapareceu. Provavelmente seria falsificada. Mas há outro fato. No livro de registros de uma bodega espanhola quase tão antiga quanto a nossa, a López de Heredia Viña Tondonia, fundada em 1877 na Rioja, consta que por volta de 1904 ou 1905 houve intercâmbio comercial de algumas garrafas de Tondonia por algumas de Vega Sicilia Unico. Portanto, deduzimos que naquela época o Unico já existia.
Como o Vega Sicilia Unico é elaborado?
O processo começa na vinha. Em Vega Sicilia temos 210 hectares de vinhedos e desse total, 150 ha. se utilizam para Valbuena e para Unico. Dependendo do ano, a porcentagem para um e para outro varia, mas podemos dizer que uns 60 ha. são usadas para produzir Unico e o restante, para Valbuena. A idade média das vinhas é de 35 anos e há parcelas com 70 anos. O vinhedo mais jovem tem 15 anos. Abaixo de 11 anos não utilizamos. O Unico parte geralmente de 90% Tempranillo e 10% Cabernet Sauvignon. Fazemos rigorosa seleção de cachos. Não sei se temos o melhor vinho do mundo, o que podemos dizer é que temos a melhor Tempranillo do mundo. Nos últimos anos fizemos muitos investimentos para melhorar a qualidade das nossas uvas.
Que tipo de melhoramentos foram conseguidos?
Foi feito enorme trabalho de seleção de clones. E também a microparcelação da vinha. Em 2005 trabalhávamos com 18 parcelas, hoje há 55, divididas em microparcelas, o que permite identificar de modo muito melhor o desempenho de cada uva e de cada porção do terreno. Por isso as parcelas são vinificadas separadamente.
Como se dá a fermentação
A uva chega à adega em condições sanitárias ótimas e é fermentada em grandes tonéis de carvalho francês, que são trocados a cada quatro anos. Ao chegar, é mantida por 24 horas em câmaras frias, para evitar o início indesejado da fermentação. Depois os cachos vão para tonéis de carvalho francês, mas antes de iniciar a fermentação alcoólica são mantidos em temperaturas até 14º C por uns seis dias, para extrair os aromas naturais da fruta. Quando a temperatura é aumentada, a fermentação tem início e segue seu curso normal. Permanece nesses tonéis por uns quatro meses.
E como é o processo de amadurecimento?
O Unico fica por aproximadamente seis anos em barricas e tanques e quatro anos em garrafa antes de chegar ao mercado. No caso da madeira, passa os primeiros dois anos em barricas de carvalho francês, sempre novas, e americano, que podem ser novas ou usadas, dependendo da safra e da decisão do enólogo. Depois permanece de 18 a 20 meses em tanques de aço inoxidável para fazer o blend e a homogeneização dos distintos lotes que o compõem. É neste momento que se busca o padrão que caracteriza o vinho. Vem a seguir uma terceira etapa, de dois anos, novamente em barrica, para reavivar e dar musculatura ao vinho, antes do engarrafamento.
Nos últimos anos houve alguma mudança de estilo no Unico?
No Unico, não. Logicamente há variação de um ano para outro, em função do comportamento do clima. O que muda é a porcentagem de Cabernet Sauvignon. Pode-se dizer que há dois estilos diferentes de Unico. Um seria mais próprio de anos frios, complicados, mais austeros, como 2007 e 2008. Dão vinhos introvertidos, fechados, mas elegantes. O outro, como 1970, 2000, 2004 ou 2005, que estamos comercializando agora na Espanha, vem de anos mais quentes. São vinhos exuberantes, potentes e finos. Mas é interessante notar que ao cabo de 15 a 20 anos, com o envelhecimento, esses dois estilos convergem para um mesmo padrão, clássico, pelo qual o Unico é conhecido.
Quer dizer que o 2005 foi lançado depois das duas colheitas posteriores?
Correto. Em 2014 lançamos a safra 2004; em 2015 e 2016, as safras 2007 e 2008. Como 2005 e 2006 foram anos muito bons em Ribera del Duero, generosos, quentes, exuberantes, e a uva tinha muita força, consideramos, do ponto de vista técnico, que os vinhos de 2007 e 2008 estavam mais prontos a beber e por isso foram comercializados antes.
Ainda é viável economicamente deixar um vinho por 10 anos nas caves, antes de lançá-lo?
Esta é uma decisão tomada pela bodega para preservar a personalidade e o estilo do Vega Sicilia Unico. Sempre foi assim. Também é o nosso vinho mais caro, porque tem uma complexidade maior que qualquer outro. Na Espanha, com certeza, e inclusive no mercado internacional, há muitos poucos vinhos com um período de guarda tão grande. Para nós não é um problema. Financeiramente seria mais rentável lançá-lo antes, mas fugiria do estilo. Há safras em que simplesmente não fazemos o Unico, como em 1992, 1997 e 2001, e isto sim é um problema financeiro. A empresa prefere ser assim, para preservar a personalidade o vinho. Se a colheita não tem a qualidade desejada, não se faz o Unico. As uvas vão para o Valbuena 5º Año. E se também não atingem o padrão do Valbuena, são vendidas a terceiros, como em 1984 e 1988.
Quantas garrafas de Unico são produzidas por ano?
Depende do ano. Pode variar de 60 mil garrafas, como em 2008, um ano difícil, a 75 mil, como em 2007, ou 110 mil, em uma safra generosa, a exemplo de 2004.
E quanto produz todo o grupo?
Temos 650 hectares de vinhedos e produzimos ao redor de 1,2 milhão de garrafas por ano. Quando os projetos Pintia e Macán estiverem em produção total deveremos chegar a 1,5 milhão de garrafas. Mas o modelo de negócios de Vega Sicilia não privilegia a quantidade e sim a qualidade. Há vinhos de garagem de alta gama, com produção anual de 5 mil garrafas. No nosso caso, o objetivo é alcançar um misto de quantidade e qualidade. Temos cinco vinícolas, cada uma com 100 hectares de vinhas em média e produção de umas 300 mil garrafas. São vinhos diferenciados, com preço proporcional, e queremos que continue assim.
O sistema de venda de Unico na Espanha ainda é feito por lista de inscrição?
Sim. Temos uma lista fechada de 3.500 clientes e a única maneira de comprar Vega Sicilia na Espanha é pertencendo a esta relação. Do total, uns mil são hoteleiros ou varejistas, que têm suas próprias lojas. Se alguém quiser comprar deles, poderá fazê-lo, claro. Mas diretamente, só os que estão na lista. Temos mais demanda que oferta. Há uma fila de espera 2 mil pessoas, algumas desde 1989.
Há alguns anos Vega Sicilia informou que pretendia produzir um vinho branco de alta gama e até plantou 10 hectares com variedades brancas. O que aconteceu?
Depois de inúmeras provas o resultado não convenceu e as uvas foram arrancadas. As provas continuam, em outras bodegas. Mas até o momento não se considera que tenham qualidade suficiente para lançar ao mercado um branco no padrão Vega Sicilia.
Vega Sicilia tem algum projeto novo em vista?
Temos, mas não posso comentar nada. Só posso dizer que agora mesmo, há dois meses, iniciamos nosso sexto projeto vinícola. Creio que será um grande empreendimento, que vai complementar bem os vinhos que produzimos atualmente. Daqui a um ano, um ano e meio, certamente teremos muitas novidades.
Source URL: http://www.brasilvinhos.com.br/2017/03/19/entrevista-antonio-menendez-diretor-geral-da-vega-sicilia/
Copyright ©2024 Brasil Vinhos