by José Maria Santana | 04/10/2019 11:42
Depois de ganhar fama internacional com sua grandiosa Bodega Garzón, perto de Punta del Leste, no Uruguai, o bilionário argentino Alejandro Bulgheroni decidiu entrar ainda mais no mundo do vinho. Com investimentos que ultrapassam 1 bilhão de dólares, fundou nos últimos 10 anos um império que hoje conta com 15 vinícolas também na Argentina, Itália, Estados Unidos, França e Austrália.
Na semana passada, esteve em São Paulo para promover os vinhos Bulgheroni na Itália a diretora de exportações do grupo naquele país, a simpática espanhola Olalla Lopez-Corona. Em prova organizada pela importadora World Wine, braço da La Pastina, foram mostrados os tintos e brancos de três marcas de Bulgheroni em três das regiões mais importantes da Toscana: Dievole, da área do Chianti Classico; Podere Brizio, de Montalcino; e Tenuta Meraviglia, no Bolgheri.
São vinhos de estilo clássico, muito bem feitos, preservando o equilíbrio e o frescor dos bons exemplares toscanos. Além do suporte dado pelo mega empresário argentino, têm por trás uma equipe de ponta, em que se destaca o renomado enólogo italiano Alberto Antonini, defensor das melhores tradições vinícolas de seu país, sem abrir mão da tecnologia moderna.
Alejandro Bulgheroni
Engenheiro industrial por formação, 74 anos, Alejandro Bulgheroni herdou do pai e ajudou a expandir a empresa familiar voltada para a exploração e refino de petróleo e gás. Em 2018, a família associou-se à British Petroleum (BP) para formar a Pan American Energy (PAE), a segunda maior produtora de petróleo e gás natural da Argentina. Bulgheroni, segundo a revista americana Forbes, é considerado a pessoa mais rica do país, dono de um patrimônio superior a 4 bilhões de dólares.
Seus negócios vão além do setor petroleiro. Desde a década de 1960 ele fez grandes aplicações também no agronegócio. Em 1999, passeando com a esposa Bettina pelo Uruguai, apaixonou-se por Pueblo Garzón, vilarejo no departamento de Maldonado, a 60 km do famoso balneário de Punta del Leste. Ali não havia quase nada, apenas campos e gado. Bulgheroni começou então a comprar terras na região, pensando cultivar amêndoas e oliveiras, para a produção de azeite.
Outra ideia era desenvolver um parque eólico, já que venta muito na região. O projeto não deu certo e ele ficou procurando o que fazer com a imensa propriedade. Em 2006, o amigo argentino Carlos Pulenta, dono da Bodega Vistalba, de Mendoza, sugeriu-lhe plantar uvas e montar uma vinícola. Bulgheroni, que há décadas nem tomava vinho, gostou da proposta.
Perfeccionista, contratou no ano seguinte o enólogo italiano Alberto Antonini, referência mundial na área. Assim em 2008 tomou forma a Bodega Garzón, com 250 hectares plantados com uvas. Em 2016 foi inaugurada a moderna e ousada adega, com 19 mil m², totalmente sustentável. A vinícola e a produção de azeite (Colinas de Garzón) fazem parte do projeto Agroland, que reúne 7 mil hectares, em três campos.
A partir de então Bulgheroni caiu de amores pelo vinho. Em 2009, associou-se ao amigo Carlos Pulenta na argentina Vistalba e não parou por aí. Como tudo o que faz é grandioso, passou a comprar novas vinícolas pelo mundo. Hoje são 15. Entre as mais expressivas, além das bodegas Garzón e Vistalba, o grupo Alejandro Bulgheroni Family Vineyards (ABFV) é proprietário de cinco vinícolas na Itália; do Château Suau, em Bordeaux, na França; de uma antiga vinícola do Napa Valley, nos Estados Unidos (hoje Bulgheroni Estates); e de uma pequena empresa em Barossa, na Austrália.
Presença na Toscana
O grupo do empresário argentino chegou à Itália em 2012. Entusiasmado com a produção de azeites de qualidade em Pueblo Garzón, Alejandro Bulgheroni queria encontrar na Toscana alguma empresa em que pudesse fazer a mesma coisa na Itália. A azienda Dievole estava à venda e ele a comprou. No entanto, mais que azeite, a casa era famosa por seus vinhos.
Logo vieram outras propriedades. Na mesma área, foi incorporada a vinícola Certosa di Pontignano; em Montalcino, agregadas Podere Brizio e Poggio Landi; e no Bolgheri, a Tenuta Meraviglia. Atualmente, o grupo ABFV possui 1.235 hectares de terras na Toscana, sendo 338 ha. plantados com uvas. Os vinhedos ocupam 157 ha. na zona do Chianti Classico; 86 ha. em Montalcino; e 95 ha. em Bolgheri. Produz na Itália 1 milhão de garrafas por safra – e pretende chegar a 3 milhões nos próximos anos, pois em algumas aziendas as vinhas foram replantadas e ainda não estão produzindo vinho.
Cada tenuta do grupo tem uma pequena equipe fixa, mas de modo geral as operações do ABFV em território italiano se concentram em Dievole. A consultoria técnica para todas as marcas é dada pelo enólogo Alberto Antonini. Além de ser a propriedade mais importante, Dievole tem história antiga e rica.
Dievole existe desde 1090 e cobre uma área total de 400 hectares em Vagliagli, pequena aldeia medieval 12 km ao norte de Siena, no coração do Chianti Classico – lembrando que esta denominação é exclusiva para os vinhedos localizados entre Florença e Siena, sendo as outras partes desta região do centro da Toscana classificadas apenas como Chianti.
Dievole, que vem da expressão “Dio Vuole”, ou Deus quer, tem 80 ha. de vinhas (sendo por enquanto 55 ha. em produção). Clima de invernos rigorosos e verões quentes, ensolarados. Apresenta solo calcário, abundante em fósseis, com presença ainda de argila, areia e marga. Estava um pouco abandonada, quando foi adquirida por Bulgheroni.
Sob orientação de Antonini, o vinhedo começou a ser restaurado. Profundo respeitador do terroir, ele mandou arrancar as variedades internacionais ali encontradas, deixando apenas as castas locais Sangiovese, Canaiolo, Ciliegiolo e Colorino, bem como as brancas Trebbiano e Malvasia Bianca.
Antonini fez a mesma coisa na tenuta Podere Brizio, em Montalcino, onde antigo e novo convivem em harmonia, e o cultivo é sustentável. Não são utilizados aditivos químicos – o plantio de fertilizantes naturais oxigena o solo e proporciona mineralidade. A azienda tem 33 hectares, dos quais 11,5 plantados com uvas, no caso, Sangiovese Grosso. Produz os tintos Rosso di Montalcino e o Brunello di Montalcino.
Já em Bolgheri a situação é um pouco diferente, pois nesta apelação se destacam castas internacionais que deram fama a vários de seus supertoscanos. Bolgheri fica na província de Livorno, junto ao Mediterrâneo. O clima é temperado pelas brisas refrescantes que sopram do mar. Ali, a Tenuta Meraviglia ocupa o topo de uma colina, de onde se avista uma longa faixa do litoral toscano. Em seus 30 ha. de vinhas, manejados com práticas agrícolas naturais, há Cabernet Franc, Merlot e Cabernet Sauvignon.
As três vinícolas, como se localizam em zonas diferentes, têm características próprias, mas com um fio condutor. Há sempre respeito às tradições locais e nos vinhedos é adotado manejo sustentável e biológico. Nas adegas, a fermentação é feita apenas com leveduras indígenas e não são usadas as barricas normais de carvalho (225 l), somente tonéis grandes (botti), sem tostagem, cuja madeira permite a microoxigenação desejada e não marca o vinho. Nas três vinícolas há tours para visitantes. Dievole e Podere Brizio contam ainda com hotéis de encantador rústico-luxuoso.
Os vinhos
Os rótulos italianos de Alejandro Bulgheroni são comercializados em nosso mercado pela World Wine, do grupo La Pastina. Por sinal, a importadora está completando 20 anos, pois foi criada por Celso La Pastina em 1999. Hoje uma das grandes empresas do setor, a World Wine se destaca pela qualidade do portfólio, especialmente do Velho Mundo. É o segundo maior distribuidor de vinhos italianos no Brasil.
Na prova realizada em São Paul, comandada por Olalla Lopez-Corona, foram apresentados cinco vinhos das três marcas que o grupo ABFV mantém na Itália. Todos de ótimo nível, sendo um branco e quatro tintos, aqui avaliados. Vão muito bem com comida, pois têm boa acidez e equilíbrio.
Tenuta Meraviglia Vermentino DOC 2017
Alejandro Bulgheroni Wines – Toscana – Itália – World Wine – R$ 210 – Nota 91
Branco expressivo, com bom volume, que nasce nos solos arenosos de Bolgheri.
A Vermentino, originária da Ligúria, deu-se muito bem na Toscana, especialmente perto do mar, na Maremma. Aqui, entra em 90% do corte, reforçada por 10% de Viognier. O vinho é fermentado e amadurecido em tanques de concreto, sem passagem por madeira. Nos aromas há cítricos e algo de pera e pêssego, em meio a notas minerais e de flores brancas. Em corpo médio, é seco, amplo, destacando-se a gostosa acidez, que reforça o frescor (13,5%).
Tenuta Meraviglia Bolgheri Rosso DOC 2016
Alejandro Bulgheroni Wines – Toscana – Itália – World Wine – R$ 269 – Nota 90
Tinto intenso que, seguindo a tendência da região, assenta-se em castas internacionais. No blend há 70% de Cabernet Franc e 30% de Cabernet Sauvignon, com repouso de 12 meses em barris de carvalho francês, sem tosta. Apresenta ao nariz cereja, ameixa, notas florais, especiarias e anis. De médio a bom copo, acidez correta, tem taninos firmes, mas maduros. Algo quente na boca, cresce com algum tempo na taça (14%).
Dievole Chianti Classico DOCG 2015
Alejandro Bulgheroni Wines – Toscana – Itália – World Wine – R$ 210 – Nota 90
Tinto elegante e bem feito, que segue a receita tradicional do Chianti, com 90% de Sangiovese, 6% Canaiolo e 4% Colorino, amadurecido por 14 meses em botti de carvalho francês, de 4 mil litros, sem tosta. Cereja, especiarias e notas florais aparecem ao nariz. Na boca mostra corpo médio, com estrutura, taninos macios, sem nada verde, e ótima acidez. Um clássico (13,5%).
Podere Brizio Rosso di Montalcino DOC 2016
Alejandro Bulgheroni Wines – Toscana – Itália – World Wine – R$ 210 – Nota 91
Tinto originário dos solos calcários de Montalcino, onde há forte concentração de depósitos marinhos. É produzido com 100% Sangiovese Grosso, variedade que tem a pele mais grossa e sementes maiores que a Sangiovese, digamos, normal. Amadurece por 12 meses em botti de 5.400 l, sem tostagem. Delicado na cor, seus aromas lembram cereja e ameixa, além de algo floral. Tem corpo médio, boa acidez, taninos maduros. Parece mais especiado que o Chianti Classico e traz no final um toque terroso (13,5%).
Podere Brizio Brunello di Montalcino DOCG 2013
Alejandro Bulgheroni Wines – Toscana – Itália – World Wine – R$ 649 – Nota 93
De estilo tradicional, delicioso, um tinto de nível superior, 100% Sangiovese, com estágio de 38 meses em botti de carvalho francês de 5.400 l, sem tostagem. Aromas ricos, em que se notam cereja, amora, mirtilo, especiarias, notas florais e um defumado. Encorpado, mostra na boca um toque vegetal, herbáceo. Tem taninos firmes, maduros, boa acidez, equilíbrio e elegância. Já no ponto para beber, e com estrutura para mais alguns anos de guarda (14,5%).
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